Friday, November 02, 2007

Guerra & Paz

Sergei Bondarchuk realizou a "versão russa" de Guerra & Paz, em 1968. Em 1956, a "versão americana" tinha aparecido, sob a direcção de King Vidor. A versão russa acompanha-me sempre, tendo escrito "Valsa" com as imagens do filme a povoarem a minha imaginação.
Esta obra cinematográfica tem a capacidade de colocar em tela os pensamentos de personagens fulcrais da obra, nada mais sendo do que as inquietações do próprio Leão Tolstoy.
Aos catorze anos, vi as versões russa e americana na televisão portuguesa. De seguida, li a obra. Desde essa altura, já perdi a conta do número de vezes que reli Guerra & Paz. Quando vivi em Inglaterra, tive a oportunidade de comprar em VHS a versão russa. Como estes personagens estão aqui comigo tão presentes, sinto que quando estiver em Lisboa, vou ter de rever esta versão russa.
Na versão americana, Peter Fonta faz de Pedro Bezukov. Mas, Pedro é um homem corpulento que não sabe o que há-de fazer com o seu corpo, criando-lhe embaraços na corte... Tem um olhar irrequieto, igualmente dócil, que se antevê por detrás das lunetas. O realizador Sergei Bondarchuk fez o papel de Pedro, assumindo na plenitude a alma deste homem puro e cheio de dúvidas sobre o sentido da vida.
A bela Natacha que na passagem para a idade adulta fica noiva do príncipe Andrei Bolkonsky. Contudo, o noivado é rompido e Pedro vai visitá-la. Ela está desesperada porque tem a noção da dor que provocou no príncipe Andrei, considerando-se indigna de tudo e de todos.
"Não me fale assim, eu não o mereço! - exclamou Natacha, fazendo menção de retirar-se. Pedro, contudo, reteve-a.
Sabia haver ainda qualquer coisa para lhe dizer. Pronunciadas que foram porém as suas palavras, ele próprio se surpreendeu.
- Não, não, não diga isso: tem a vida toda diante de si - murmurou ele.
- Eu? Não, para mim tudo acabou - replicou ela num sentimento em que havia vergonha e humildade.
- Tudo acabou! - repetiu ele. - Se eu não fosse quem sou, se fosse o mais belo e o mais inteligente dos homens sobre a Terra, e se fosse livre, pedir-lhe-ia, neste mesmo momento, de joelhos, a sua mão e o seu amor.
Natacha, pela primeira vez de há muito tempo para cá, foi acometida de um ataque de choro, choro de reconhecimento e de emoção, abandonando a sala com um olhar de agradecimento.
Pedro saiu logo atrás dela, refugiando-se, por assim dizer, no vestíbulo, enquanto sufocava as lágrimas de felicidade que lhe haviam subido aos olhos. E, enfiando a peliça ao acaso, subiu para o trenó que o aguardava.
- Aonde vamos agora? - perguntou o cocheiro.
"Aonde vamos?", repetiu Pedro de si para consigo. "Aonde poderemos ir agora? Ao clube ou fazer visitas?" Tudo se lhe afigurava tão miserável, tão pobre, em comparação com os sentimentos de amor e doçura que o tinham invadido com aquele olhar comovido e cheio de reconhecimento, velado de lágrimas, que Natacha pousara nele.
- Para casa - gritou Pedro, que, apesar de dez graus abaixo de zero, abrira a peliça de urso e deixava dilatar de felicidade o seu largo peito." in Guerra & Paz
E como este momento ficou magistralmente registado na versão russa!
- Maggs -

2 comments:

Anonymous said...

simplesmente belo

Maggy said...

Minha Querida,

É a vocês, os meus pais, que devo a descoberta deste grande escritor.

Bijim x3